segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Aproveitar a Vida

(eu caminhando no Três Picos - foto de Flávio Varricchio)

Entre a temeridade e a renúncia passa o estreito e incerto caminho sobre a aresta da aventura. E aquele que, ao menos uma vez, lutou para se manter na corrente duma verdadeira viagem, esse sabe que por esse caminho poderá sempre apreender a medida das suas forças e conhecer o exato valor da vida vivida. Dum lado, apresenta-se-nos a parte radical raiando a inconsciência, do outro lado estende-se a versão fácil de todas as inquietudes, na base da qual as vias suaves apelam a viver simulacros. Sobre este elevado sentimento, é necessário questionar a vertigem e as suas dúvidas. Mas aqui vivemos de boa lucidez e de simples coragem. Se a margem de manobra é por vezes restrita, a vista magnífica que temos sobre o mundo faz do aventureiro aquilo que o navegador Gerard Janichon chama de “um viajante universal da vida”. E sobretudo, à custa de esforços, habituamo-nos a correr o risco por aquilo que ele vale: o indispensável, a parte necessária à verdadeira viagem, aquela que é necessária no mesmo instante procurar e evitar.

O risco tem duas faces. É aliás o perigo, por vezes mortalmente redutor da vida, insuportável eventualidade do azar, mas também o desconhecido, o “belo risco”, que, pela descoberta e a invenção, conduz quase sempre a uma valorização da vida. Essas duas faces são inseparáveis, e não podemos contemplar um sem encontrar o outro: Privada de riscos, a aventura nada oferece. Mas arriscada demais, ela torna-se absurda.

Tem-se dito do alpinismo que é a arte de procurar os maiores perigos fazendo tudo para os evitar. Assim sendo de todas viagens perigosas, aquilo que faz a sua essência, não são os riscos em si mesmos, mas a arte de os evitar. Evita-los em si, e não por outros que antecipadamente os desviaram do caminho.

No regresso de uma primeira ascensão no Alasca, no seguimento da qual acabara de perder um amigo, David Roberts escrevia num livro justamente intitulado “Momentos de Dúvida”: “Este choque e este medo que os últimos dias da nossa expedição nos habituaram mascaram hoje a imagem radiosa duma marcha perfeita – a macha do cume – onde a harmonia parecia sem defeito. Poderíamos nós ter encontrado um modo menos arriscado de nos tornarmos amigos? Teria sido possível? Talvez tenha sido o risco, ele mesmo, que contribuiu para nos unir...” Para encontrar a resposta a estas questões, podemos escutar o alpinista e guia de montanha Paul Keller: “Querer banir todo o risco da existência individual e coletiva, é condenar ao imobilismo. Reivindicando um direito ao risco, os alpinistas não defendem somente o alpinismo, mas uma qualidade de vida dos indivíduos e da sociedade, onde o prazer e o esforço se misturam à necessidade de empreender e à recusa do status quo.”

Entre as agruras do perigo e a paralisia suscitada por vezes pelo medo, passa o estreito caminho da aresta da viagem perigosa, ao longo da qual o caminhante livre e responsável de si mesmo, vai procurar as maravilhas que ele necessita para viver e que ele vai trazer aos outros. Lá em cima, sobre estas arestas do risco, na vertigem da imensidão do mundo, ele tem certos direitos, não à segurança, mas aos meios da sua própria segurança. Que seria da sua viagem se ele não saísse fora dos carreiros balizados?

O direito à vida segura não é nada sem o outro bem, o direito à aventura.

Entre as griseries do perigo e a paralisia suscitada por vezes pelo medo, passa o estreito caminho da aresta da viagem perigosa, ao longo da qual o caminhante livre e responsável de si mesmo vai procurar as maravilhas que ele necessita para viver e que ele vai trazer aos outros. Lá em cima, sobre as arestas do risco, na vertigem da imensidão do mundo, ele tem certos direitos, não à segurança, mas aos meios de sua própria segurança. Que seria da sua viagem se ele não saísse fora dos carreiros balizados? O direito à vida segura não é nada sem o outro bem, o direito à aventura. À l’aventure.

(desconheço o autor)

2 comentários:

  1. Bom artigo, com ótimas definições. Eu já estava mesmo conseguido entender que eu gosto de aprimorar a minha capacidade de resolver situações complicadas e me safar de enrrascadas. Mas para isso...

    Abraço

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    1. Legal Junir ! O direiro à aventura é o que permite a evolução do montanhismo.

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